A lógica, e já conversámos sobre isto muitas vezes, é a presunção de culpa. Para tudo existe a presunção da inocência; no mundo da administração pública, e muito especialmente na Educação, existe apenas a presunção de culpa. Para quem como eu, não tem dúvidas nenhumas sobre - como dizer isto? - a míngua ontológica de realidades - mais dispendiosas do que pedagógicas - como são o Estudo Acompanhado e a Formação Cívica leccionada por directores de turma e, para quem considere que praticamente todo o ensino devia ser uma extensa e trabalhadora Área de Projecto, todas as recentes reflexões directivas do ministério reverberam a única coisa que assiste a toda a sua incontinente legislação: "o pessoal trabalha pouco e é preciso pôr cobro a isso". Ora como fazer isso com os atavismos curriculares herdados? Até parece que dá para escutar o que rumorizam aqueles cerebrozitos encurralados entre aquilo que aprenderam nos livros e as orientações ministeriais. Obliquidades equívocas e circenses como "Tanta formação cívica e continua a haver violência nas escolas?" ou "Tanto estudo acompanhado e ainda querem mais apoios educativos e educação especial?". Como resolver a questão? Aí vai, aí vai, atenção agora:
relatórios escritos.Cá está ele de novo. Relatórios escritos. Se estiver escrito podemos ficar a saber o que fizeram. Ali, preto no branco. É para ler? Ná. Pronto, aí uns trinta ou quarenta para dar a impressão que sim. Levanta-se um processo aqui ou ali para armar a tenda. O relatório escrito é uma espécie de corpo de intervenção com a divisa dos escuteiros: sempre pronto. "Pelo sim, pelo não", o mote calaceiro do inepto.
O apetite por relatórios é o expediente clássico do retardatário. O relatório escrito é a rede do acrobata de ministério. Está ali porque acredita que dessa maneira pode cair em segurança. O inquisidor pode dar a entender que a qualquer momento pode interrogar o que os professores andaram a fazer o ano todo. Porque leu um relatório? Não. Nada disso. Porque tem um relatório que pode ler a qualquer momento.
Por mim, mal consigo esperar para cumprir a minha parte e enviar os meus relatórios pela janela fora até chegarem ao colinho recatado e balsâmico de um benigno agente ministerial que acha que a culpa é, dê lá por onde der, toda minha.
(Esta prosa vem a propósito de um, mais um, desabafo sério do Paulo Prudêncio que pode e deve ser lido
aqui)